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Estupro é estupro, o resto é aberração jurídica

Coletivo de Mulheres Trabalhadoras do Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo (Sindsep/SP) exige justiça para Mariana Férrer.

Publicado: 06 Novembro, 2020 - 17h31

Escrito por: Sindsep/SP

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Em 2018, a blogueira/influenciadora digital Mariana Ferrer, aos 21 anos foi vítima de estupro durante uma festa em um clube de luxo em Florianópolis (SC). Em sua denúncia, Ferrer relata que foi dopada e estuprada pelo empresário André Camargo Aranha; ele nega o crime. Pois bem, após mudança do primeiro promotor do caso, Alexandre Piazza, que denunciou André de Camargo Aranha por estupro de vulnerável, o atual promotor alegou que não havia como o empresário saber, durante o ato sexual, que a jovem não estava em condições de consentir a relação, não existindo, portanto, intenção de estuprar – alegando o termo “estupro culposo”. O juiz aceitou a argumentação e o empresário foi inocentado pela Justiça!

Lembrando que o primeiro promotor chegou a pedir a prisão preventiva do empresário, aceita pela justiça e depois derrubada em segunda instância pela defesa de Aranha, a alegação da primeira promotoria era que havia prova do material genético colhido na roupa de Mariana, além de um copo onde Aranha bebeu água durante interrogatório, incriminando o agressor. Também foram consideradas “as mensagens desconexas encaminhadas pela vítima aos seus colegas” quando estava no local do crime, além dos próprios depoimentos de Mariana, da mãe e do motorista do Uber que a levou em casa e ouviu o seu desespero ao falar com a mãe.

A vergonhosa decisão da Justiça de Santa Catarina no dia 3 de novembro de 2020, teve o vídeo da audiência vazado nas redes virtuais; causando horror o show de ilegalidades para com a vítima. O advogado do réu, Cláudio Gastão da Rosa Filho, humilhou a vítima durante depoimento e mostrou imagens sensuais de Ferrer, enquanto atuava como modelo, como reforço ao seu argumento para induzir de que o ato foi consensual. Definindo as fotos como “ginecológicas”, sem ser questionado em nenhum momento sobre a relação delas com o caso, o advogado afirma ainda que “jamais teria uma filha” do “nível” de Mariana. 

Em outro momento, o advogado desclassifica a reação da vítima. “Não adianta vir com esse teu choro dissimulado, falso e essa lábia de crocodilo”, afirma o advogado. Mariana apela ao juiz: “excelentíssimo, eu tô implorando por respeito, nem os acusados são tratados do jeito que estou sendo tratada, pelo amor de Deus, gente. O que é isso?”. O juiz nada faz, apenas pede para o advogado manter um “bom nível”.

O resultado é que promotoria e o juiz ao julgarem o caso de estupro de Mariana Ferrer optam por não cumprir a Lei e punir o estuprador, numa tentativa de transformar a vítima em ré. 

Casos como esses se repetem no país. "Estupro culposo" revela a cara de um país sexista. No caso específico, a cereja do desastre é a dimensão tecnicista dos cursos de Direito que "formam" sem ênfase humanista, sociológica e filosófica, o que amplia e colabora para o caos e todo tipo de preconceito e desrespeito. Falta formação adequada (currículo) aos profissionais do Direito. Cenas como as vistas na audiência de Mariana Ferrer são frequentes e legitimadas por discriminações de gênero, de raça/etnia, de classe e sexualidade.

Lembremos que o Brasil tem se tornado um dos piores países para mulheres e meninas. A cada 11 minutos uma mulher sofre estupro, 30% das vítimas são menores de 13 anos de idade. Realidade essa reforçada por instituições que deveriam combater a violência e proteger as vítimas, mas que, por péssima formação reproduzem o machismo e misoginia. 

A tese de “estupro culposo” está gerando revolta, no calor do noticiário, e isso é excelente, mas não podemos deixar que arrefeça essa revolta. É por essa razão que o Sindsep, por meio do Coletivo de Mulheres do Sindsep-SP, repudia veementemente a decisão da Justiça catarinense e encaminha esta nota ao Escritório Regional da Internacional dos Serviços Públicos (ISP), para reforçar o espalhamento da luta contra o machismo em todo o mundo.

Não podemos aceitar tamanho desrespeito às mulheres! 

Coletivo de Mulheres Trabalhadoras do Sindsep-SP