Escrito por: Déborah Lima

Controle do petróleo brasileiro foi um dos principais motivos do golpe, afirma professor da UFABC

A deposição de Dilma Rousseff foi o primeiro passo para a entrega do petróleo do Brasil às transnacionais. A conclusão é do professor de Relações Internacionais da UFABC, Igor Fuser

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Igor Fuser ministrou o curso de formação da Plataforma Operária para a Energia

"A crise mundial e as disputas em torno do petróleo" foi o tema da palestra de abertura da 1ª etapa do Curso de Formação de Formadores da Plataforma Operária e Camponesa para a Energia - Ceará, ministrada pelo jornalista e professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC Paulista, Igor Fuser. 

A UFABC é uma das 23 universidades criadas nos governos Lula/Dilma. Mais da metade de seus alunos são os primeiros da família a ter acesso ao ensino superior, graças a política de inclusão implantada com as cotas raciais e sociais. "É um lugar onde se faz uma educação crítica", diz Fuser com orgulho.

E educação crítica é a tônica do curso, que está sendo realizado em Fortaleza, nos dias 1º e 2 de junho, na sede do Sindicato dos Eletricitários. O objetivo é capacitar 50 formadores de diversas entidades, entre elas a Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal (Confetam/CUT), representada pela presidente Vilani Oliveira, pela secretária de Mulheres da entidade, Ozaneide de Paulo, e Aparecida Castro, presidente do Sindicato dos Servidores Municipais de Barreira e coordenadora regional da Fetamce no Maciço do Baturité.

Após o curso, o papel dos formadores será disseminar as ações previstas na Plataforma Operária e Camponesa de Energia, visando o esclarecimento da população sobre questões relativas à defesa estratégica das riquezas naturais do Brasil, como petróleo, gás, água, terras e minérios, para assegurar a soberania nacional.

A importância econômica do petróleo

O professor Igor Fuser fez um relato da importância política e econômica do petróleo, numa perspectiva mundial, e sobre a relação desta fonte de energia, e também do gás natural, em conflitos e guerras, particularmente no Oriente Médio. Como exemplo, ele citou a invasão do Iraque -  que detém a terceira maior reserva de petróleo no mundo - pelos EUA, em 2003. "O governo foi derrubado e veio o caos, que resultou na morte de mais de 400 mil pessoas".

Na sequência, apontou o caso da Síria, que não é um grande produtor petróleo, mas está localizada geograficamente na rota dos oleodutos e gasodutos que levam energia para o Ocidente. Citou ainda a Líbia, invadida por forças da Europa. "Eles tiraram o governo e hoje o poder está nas mãos de centenas de milícias regionais. É o único país do mundo que não tem embaixadas estrangeiras. No entanto, o petróleo de lá continua sendo explorado por forças internacionais e empresas estrangeiras que se apoderaram dele".

Ele assinalou ainda os casos da Rússia, que enfrenta o império norte-americano de forma soberana por ser exportadora de petróleo e gás, e da Venezuela, que detém a maior reserva de petróleo do mundo. 

Recursos estratégico à sobrevivência

"O petróleo não é uma simples mercadoria. É um recurso estratégico à sobrevivência econômica, uma fonte de energia fundamental da qual depende a defesa de qualquer país. As Forças Armadas são movidas a petróleo, que garante a produção de qualquer bem econômico. Das dez maiores empresas do mundo, cinco são de petróleo. Essas empresas também estão no Brasil explorando petróleo". 

A Petrobrás está na lista das 20 maiores empresas de petróleo do mundo e não por acaso, afirma o professor, há uma tentativa de desvalorizar a estatal brasileira. "É para privatizar o máximo que conseguirem desse setor do capital internacional", denuncia. 

O petróleo é o principal componente da matriz energética mundial. Representa 35% da energia usada no mundo, com tendência de aumento do consumo absoluto em função do crescimento populacional e do padrão de vida, entre outros fatores.

A guerra do petróleo

A origem dos conflitos, explica Igor Fuser, é a distribuição desigual das reservas de petróleo pelo planeta. As nações mais desenvolvidas industrialmente, como os EUA e países da Europa, são partes do mundo com petróleo insuficiente. 

Até o século XX, os EUA foram o maior exportador de petróleo do mundo, mas os hábitos de consumo norte-americanos exauriram o recurso natural e hoje o país depende da importação do produto, conta o professor.  

"A história natural colocou mais da metade do petróleo do mundo no Oriente Médio. Cinco ou seis países têm mais da metade do petróleo do planeta", destaca. Em segundo lugar vem a Região das Américas do Sul e Central. Os países da Europa praticamente não tem petróleo. 

"Quem não tem vai buscar onde tem e quem precisa mais são os países politicamente, militarmente e economicamente mais poderosos do mundo, que usam esse poder para impor historicamente suas condições de retirar esses recursos da forma mais conveniente para eles. Se não tivesse petróleo, o Iraque não tinha sido invadido. Morreram cinco mil soldados americanos, mas os EUA acham que valeu a pena", critica. 

O Império contra-ataca

O governo FHC tentou privatizar a Petrobrás, mas a resistência dos petroleiros e de setores conservadores nacionalistas foi decisiva para impedir. "Privatizaram parcialmente, mas a Petrobrás sobreviveu à ofensiva neoliberal" destaca.

Após os governos Lula - cuja concepção era usar os recursos da exploração do petróleo em favor do desenvolvimento social -, e a deposição da presidenta Dilma - a primeira etapa do golpe -, a ofensiva neoliberal voltou-se novamente para o Brasil. "O Império avança no Brasil, somos prova disso. Mas existe resistência", enfatiza.  

Estabelecendo-se uma relação entre o chamado "escândalo da Petrobras", o golpe travestido de impeachment contra Dilma e a entrega do pré-sal à exploração das transnacionais, Igor Fuser concorda que há nexo entre os acontecimentos. "Quantos funcionários da Petrobras estavam envolvidos em corrupção? Contamos nos dedos da mão. Não dá dez e a maioria foi indicada pelo PSDB", lembra. 

Para reverter a onda de esquerda

Em relação a América Latina, o professor afirma que existe um consenso entre as classe dominantes e o grande capital de que é necessário reverter a onda de esquerda que ganhou corpo na região a partir do governo Hugo Chávez, na Venezuela.

"Em função da ascensão de governos com alguma característica progressista, que buscam autonomia do sistema internacional e defendem os interesses populares, eles partiram para uma contraofensiva que busca não simplesmente a substituição de governos, mas garantir ao máximo possível que não haja uma outra onda progressista nesses países", resumiu. 

"Não basta tirar a Dilma. Essa foi a primeira etapa do golpe. O objetivo do plano é ter o controle total dos recursos de cada um desses países porque eles (os imperialistas) precisam desse recursos. Não basta tirar o Lula. Tem de criminalizar o PT, que tem um potencial de transformação, e destruir os movimentos sociais para que não tenhamos mais chances de nos reerguermos", explicitou.

No entanto, o professor considera que o golpe no Brasil já fracassou. "Eles não esperavam a resistência que está tendo", comemorou. 

Debates encerram hoje

O Curso de Formação de Formadores da Plataforma Operária e Camponesa de Energia prossegue hoje com explanação e debate sobre o contexto político e econômico do petróleo no Brasil, as disputas em torno da Petrobrás e a centralidade do pré-sal. 

Após o debate, os participantes construirão juntos o Plano de Trabalho do curso e sistematizarão o Plano de Lutas da formação de formadores. As atividades encerram às 16 horas.

O curso também contou com as participações de Carmem Santiago, Valter Saraiva, Iracema de Oliveira e Elisvaldo Oliveira, dirigentes da Federação dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal no Ceará (Fetamce).